"Sniper Americano" acerta o alvo ao focar drama psicológico de protagonista

Uma guerra pode ter efeitos devastadores sobre um povo e que vão muito além de mortes, bombardeios e cidades dizimadas. O conflito armado também pode alterar completamente a personalidade de um envolvido diretamente na ação e transformá-lo em outra pessoa. Esse é o argumento que conduz o novo filme de Clint Eastwood, "Sniper Americano", em cartaz nos cinemas brasileiros.
Baseado em uma história real, o longa narra a trajetória do famoso atirador Chris Kyle (Bradley Cooper), considerado um herói de guerra pelos norte-americanos e, também, letal, por conta das mortes pelas quais foi responsável durante sua atuação no Iraque. Na infância, Kyle era influenciado por um pai rígido, que ensinava conceitos muito republicanos da cultura de lá, que incluía noções de caça e manuseio de armas.
Alimentando o desejo de se tornar um cowboy, Kyle tem o sonho interrompido pelos ataques terroristas de 11 de setembro, em Nova York, que o influenciam a procurar as Forças Armadas para servir seu país na luta contra o terrorismo. Na Marinha, ele usa suas habilidades de atirador para eliminar os inimigos e, assim, transforma-se em uma referência para o exército, com centenas de mortes no currículo. 
Em quatro passagens pelo Iraque, Kyle mostra-se decisivo para o êxito da operação, mas não escapa do peso e da responsabilidade de eliminar vidas e perder companheiros nas batalhas. Todas as vezes que voltava para a esposa (Siena Miller) e os filhos, porém, ele apresentava uma marca diferente em sua personalidade. Aos poucos, vemos o homem comum transformar-se em um sujeito agressivo, traumatizado e paranoico. 
Polêmico, "Sniper Americano" recebeu diversas críticas e foi acusado de "glorificar um assassino". Particularmente, acho que o filme não faz nada disso. A narrativa densa e muito envolvente privilegia os aspectos psicológicos do protagonista e usa o conflito armado no Iraque para uma reflexão sobre o peso e a força de um gatilho, que pode causar ferimentos profundos também em quem o dispara.
O roteiro e a direção de Eastwood acertam ao não tomar partido de Kyle, apresentando a história sem julgar ou adjetivar o personagem, como acontece em muitas biografias no cinema. O resultado final permite que o espectador reflita e inicie uma discussão sobre uma realidade tipicamente republicana, que vive em contato direto com um dito patriotismo e, também, com o porte de armas.
Com várias atuações ruins no currículo, algumas que espantosamente renderam a ele indicações ao Oscar, Bradley Cooper, é preciso admitir, se dá bem nas mãos do diretor e mostra dedicação e esforço, físico inclusive, para interpretar o atirador mais famoso dos Estados Unidos. Apesar de ter um desempenho melhor do que o habitual, a indicação do ator ao Oscar desse ano também é exagerada e, pelo terceiro ano seguido, ele rouba a vaga de um intérprete mais merecedor. Enquanto Cooper é superestimado pela Academia, Eastwood foi ignorado e seu bom trabalho de direção ficou de fora da premiação.
Com seis indicações ao Oscar, "Sniper Americano" acerta em cheio o alvo ao expor as consequências psicológicas de um homem responsável por tantas mortes. Os efeitos da guerra, que podem perseguir uma pessoa, mesmo quando ela está distante do conflito, renderam mais um bom filme da lista do Oscar deste ano. 


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