História interessante é prejudicada por narrativa "sem alma" de "Spotlight"

Mais do que em ter uma boa história, um filme deve se preocupar com a forma com que ela será levada ao público. Juntos, esses processos, além de outros envolvidos no meio do caminho, são fundamentais para que um longa atinja o espectador e possa se comunicar com ele. Quando há uma história forte, como é o caso de "Spotlight", outro dos indicados ao Oscar nesse ano, é muito importante que os roteiristas e o diretor percebam de que forma podem valorizar aquele rico material, através da narrativa e do ritmo que será impresso ao trabalho. Esse, no entanto, é o principal pecado do filme de Tom McCarthy.
Baseado em uma história real, o longa mostra o trabalho de um grupo de jornalistas conhecido como Spotlight, profissionais do jornal The Boston Globe responsáveis por profundas e apuradas reportagens jornalísticas. A chegada de Marty Baron (Liev Schreiber), o novo editor do jornal, faz com que o grupo deixe de lado um trabalho sobre a polícia de Boston para se dedicar a um caso que, até então, havia sido retratado de forma modesta na imprensa local: o caso de padres que abusam sexualmente de crianças.
Os trabalhos são conduzidos pelo editor responsável pelo Spotlight, Walter Robinson (Michael Keaton), que mobiliza os jornalistas Michael Rezendes (Mark Ruffalo), Sacha Pfeiffer (Rachel McAdams) e Matt Carroll (Brian d´Arcy James). Os trabalhos do grupo começam com a análise de antigas publicações do próprio jornal e, também, a tentativa de ter acesso a documentos de um antigo processo, mas que foram colocados sob segredo de justiça. 
O grupo encontra resistência, mesmo que velada, para levar adiante as investigações, já que era raro que um veículo de comunicação tivesse coragem de enfrentar uma instituição como a Igreja Católica, tão valorizada pela sociedade de Boston. Cruzando informações e entrevistando vítimas, estudiosos e advogados, os jornalistas acabam descobrindo que a situação é muito mais abrangente do que se imagina e que não envolve apenas um ou outro padre. 
Decidido a revelar a proteção dada, por diversos setores da sociedade, aos abusadores, o grupo acaba chegando até o alto cardeal da cidade e, ainda, descobrindo que a prática de molestar crianças envolvia um número absurdo de padres, o que revelou, também um padrão de comportamento da instituição religiosa em "varrer tudo para debaixo do tapete".
Antes de tudo, é preciso dizer que "Spotlight" tem um enredo muito interessante, que, nos dias de hoje, funciona como uma homenagem ao jornalismo investigativo e aos profissionais que se dedicam ao ofício. O caso real é emblemático e merecia ganhar as telonas em um filme que agrade jornalistas e, também, o grande público. Do jeito que foi executado, no entanto, "Spotlight" perdeu a oportunidade de ser um grande filme.
O problema mais sério do longa é a forma como a narrativa foi construída. O mais curioso aqui é que "Spotlight" não tem um roteiro ruim, ele é até bem correto, mas também é aqui que está a falha. Muito tradicional e "quadrado", o roteiro parece não entender em quais pontos a história deveria ganhar força. Isso faz com que, no resultado final, o longa pareça muito constante, sem recursos narrativos o façam provocar emoção.
A condução do diretor é um fator determinante para o resultado de "Spotlight". Claramente tentando trazer o filme para um tom mais sóbrio, McCarthy acaba construindo uma distância muito grande entre a história e o público. Não é estabelecido envolvimento com o que está sendo contado e, na maior parte do tempo, deixa a impressão que a direção é muito indiferente ao que está sendo contado. Falta, de alguma forma, construir uma conexão com o público.
O elenco de "Spotlight", elogiado e consagrado nessa temporada de premiações, é muito correto, mas também deixa a impressão que não há grandes esforços dos atores. Os grandes destaques são Mark Ruffalo, que merece a indicação ao Oscar que recebeu, Liev Schreiber e Stanley Tucci. No mais, Michael Keaton e Rachel McAdams não saem do básico e John Slattery, que faz um dos editores do jornal, parece ter saído diretamente dos escritórios da agência de publicidade da série "Mad Men" para o filme.
Indicado a seis Oscars, "Spotlight" tinha um grande potencial, mas acabou prejudicado por escolhas no roteiro e na direção que tiraram a força que a narrativa poderia ter. No fim, o filme acaba parecendo indiferente e "sem alma", o que é uma pena considerando o rico material e a trama envolvente sobre jornalismo investigativo. "Spotlight" não passa de apenas mais um filme sobre a imprensa.

SPOTLIGHT

COTAÇÃO: ★★ (regular)



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