"O Quarto de Jack" comove com olhar ingênuo sobre realidade cruel

Imagine o impacto de ser sequestrado e passar anos vivendo em um cubículo, em contato apenas com seu raptor e privado de qualquer laço com o mundo. Por mais que possamos refletir sobre isso, talvez nunca cheguemos nem perto de alguma noção sobre a experiência. Mesmo assim, só a possibilidade de nunca mais termos contato com o mundo que conhecemos já parece muito assustadora. Agora, tão assustadora quanto pode ser a sensação de nascer em um cativeiro e, só conhecendo aquele universo, ser colocado em liberdade e ter que encarar a nova realidade. O olhar de uma criança sobre essa situação é retratado pelo filme "O Quarto de Jack", indicado ao Oscar 2016.
O longa mostra a rotina de Joy (Brie Larson) e do filho Jack (Jacob Tremblay), que vivem em um cativeiro. Sequestrada há sete anos por um homem conhecido como Velho Nick (Sean Bridgers), Joy vive em um espaço minúsculo e sofre constantes abusos do raptor. Apesar da limitação imposta pelas paredes daquele quarto, ela tenta manter Velho Nick o mais distante possível do filho, fruto da relação que é obrigada a ter com o sequestrador.
Para amenizar a dura realidade, Joy cria um universo lúdico para o filho, que não tem noção nenhuma da existência do mundo fora do quarto. Assim, ela explica a Jack que aquele espaço concentra tudo que existe e que, do lado de fora, há apenas planetas e criaturas transmitidas pela televisão. Quando o menino completa cinco anos, a protagonista decide revelar a verdade ao filho e o convence a enganar Velho Nick para escaparem dali.
Livre do cativeiro, Jack segue as instruções da mãe e consegue pedir ajuda. Suas instruções fazem com que a polícia encontre o quarto em que ele e a mãe foram feitos reféns. Habituados a uma rotina e a um estilo de vida, Joy e Jack voltam para o convívio da família, mas descobrem que lidar com o mundo fora do quarto pode ser uma experiência igualmente sofrível. 
Dirigido por Lenny Abrahamson e baseado no livro da autora Emma Donoghue, que também é responsável pelo roteiro, "O Quarto de Jack" é uma produção pequena, mas de uma força imensa. Sua grande qualidade é a abordagem da história, feita a partir do olhar ingênuo do menino. Dividido em dois atos, o roteiro mostra, em um primeiro momento, a percepção daquela criança sobre a vida no cativeiro e a rotina com a mãe, além das visitas constantes do sequestrador. Em seguida, a trama parte para a adaptação do garoto e a descoberta de um mundo, até então, só visto pela televisão. 
A sensibilidade dos diálogos é o que faz toda a diferença no filme. Com um tema difícil, a história poderia ser conduzida de forma pesada, mas tudo e tratado com uma leveza surpreendente, sem deixar de lado o impacto da experiência vivida pelos personagens. Essa sutiliza também é pontuada pela direção, que constrói sequências emocionantes, utilizando efeitos de luz e enquadramentos claustrofóbicos para mostrar a vida no cativeiro.
Favorita ao Oscar de melhor atriz, Brie Larson é uma grata surpresa. Sua atuação dá o tom de muitas cenas e seu olhar desesperado e traumatizado conquista facilmente o espectador. Não será injusto se a estatueta vier para ela. O garoto, Jacob Tremblay, é o que mais emociona. Com ingenuidade e medo, o menino domina todas as cenas com um talento impressionante. Ainda há a ótima Joan Allen, vivendo a mãe de Joy, e uma pequena, porém marcante, participação de William H. Macy.
Com quatro indicações ao Oscar, "O Quarto de Jack" é um drama emocionante, capaz de levar às lágrimas o sujeito mais durão. Pequeno, o filme se sobressai e é um dos melhores na lista da premiação da Academia neste ano. A partir do olhar ingênuo de uma criança, conseguimos ter uma ideia, mesmo que mínima, sobre os efeitos de uma realidade devastadora. 

O QUARTO DE JACK

COTAÇÃO: ★★★★ (ótimo)


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