Se tem uma coisa que Hollywood sabe fazer, é estragar bons filmes internacionais e transformá-los em apenas mais uma produção da indústria do entretenimento. Uma das últimas vítimas desse "incontrolável" desejo de "moldar" histórias alheias é o vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2010, "O Segredo dos Seus Olhos", do diretor argentino Juan José Campanella, que se transformou, na terra do Tio Sam, em "Olhos da Justiça", um longa que em nada lembra a obra original.
No filme de Campanella, o protagonista, vivido pelo sempre ótimo Ricardo Darín, se aposenta do cargo de oficial de justiça, decide escrever um livro e passa a revisitar os detalhes de um caso marcante e sem solução: o estupro e assassinato de uma jovem. Ao lado de antigos companheiros, ele mergulha no mistério para tentar encontrar o responsável pelo crime, o que culmina em um final surpreendente.
Agora, "Olhos da Justiça" parte da mesma premissa, mas procura adaptar a trama para a realidade hollywoodiana. O papel central agora é de Chiwetel Ejiofor, que vive Ray, um investigador do FBI envolvido na investigação do assassinato da filha de Jesse (Julia Roberts), sua parceira de trabalho. As pistas sobre o crime levam até Marzin (Joe Cole), um jovem também envolvido em uma operação antiterrorista da polícia.
A falta de provas do envolvimento do garoto e a cooperação dele com as autoridades, afetadas pela ameaça terrorista que assombrou os Estados Unidos depois do 11 de Setembro, fazem com que Marzin seja considerado "intocável" para a investigação de Ray. Os esforços para tentar prender o jovem não dão resultado e o crime fica sem solução.
Depois de uma passagem de tempo de 13 anos, Ray volta ao departamento com a intenção de reabrir o caso da morte da filha de Jess, trazendo, inclusive, pistas seguidas obsessivamente sobre o paradeiro de Marzin. O retorno do investigador também serve para retomar o amor platônico dele por Claire Sloan (Nicole Kidman), agora chefe da equipe.
Escrito e dirigido por Billy Ray, "Olhos da Justiça" é resultado de uma "peneira" que Hollywood faz questão de passar em argumentos ou histórias vindos de fora, pretensiosamente, talvez, para "melhorar" a obra. O efeito, porém, na maior parte dos casos, é contrário e devastador. A "pasteurização" do original argentino criou um roteiro confortável, pouco criativo e sem personalidade, que resulta em um produto extremamente oposto ao original.
O pano de fundo político da história continua presente na nova versão, mas de forma enfraquecida. Enquanto, na primeira versão, era possível ver a influência da ditadura argentina dos anos 70 na história, aqui os roteiristas optaram por ambientar o enredo nos Estados Unidos pós-2001, um país marcado pela paranoia e terror criados pela queda do World Trade Center. A opção, porém, não traz à história os mesmos efeitos da primeira, com elos que soam, muitas vezes, forçados a serem incluídos no contexto.
O desempenho do elenco acompanha o fluxo do filme e se mostra raso. Julia Roberts, vivendo a mãe marcada pela morte da filha, é a que se sai melhor, mostrando força e emoção nos momentos necessários. Bom ator, Chiwetel Ejiofor não repete os feitos de outros trabalhos e parece, em muitas cenas fundamentais, distante e pouco convincente. Já Nicole Kidman cumpre o papel que lhe cabe, mas repete a falta de expressão que a acompanha em muitas produções.
O desejo de Hollywood em "tomar" para si uma boa história acabou criando um filme ruim. "Olhos da Justiça" diluiu a personalidade do roteiro original e produziu um longa homogêneo para os padrões norte-americanos, porém insosso. O resultado, talvez, fosse mais satisfatório se a criatividade fosse usada para trabalhar a história de outra forma, apresentando novidades. A pretensão hollywoodiana não permitiu a percepção de que replicar a qualidade argentina de fazer cinema não faria mal ao produto. Mas, enfim, está aí o resultado de quem "sabe tudo de cinema".
OLHOS DA JUSTIÇA
COTAÇÃO: ★ (ruim)
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