"Esquadrão Suicida" erra ao tentar costurar tramas incoerentes e subaproveitar bons personagens


Já pensou em assistir dois filmes diferentes ao mesmo tempo, na mesma tela? Já imaginou se, em determinado momento, as duas tramas se unirem e formarem uma nova e caótica história, que força um ponto em comum para justificá-la. Bom, tudo isso não precisa mais ser imaginado, pois já está em cartaz nos cinemas "Esquadrão Suicida", nova empreitada da Warner e da DC Comics para tentar emplacar a construção do universo dos quadrinhos nos cinemas. O resultado, infelizmente, é marcado por incoerência e personagens mal aproveitados, 
A premissa parecia ótima e, pelo menos no início do filme, funciona bem. Preocupada com a chegada de um novo ser de força extraordinária, como o Superman, Amanda Waller (Viola Davis) tenta convencer o governo a adotar um arriscado projeto de segurança: recrutar os piores vilões já conhecidos para defender a população de qualquer futura ameaça. Para colocar o plano em prática, a agente linha dura estuda fraquezas e formas de convencer figuras estranhas e nada amigáveis a executarem missões arriscadas, em troca de uma ligeira redução em suas penas.
Um dos vilões escolhido para o projeto é o Pistoleiro (Will Smith), um implacável matador de aluguel, que não erra nenhum tiro. Preso pelo Batman (Ben Affleck) por seus crimes em Gotham City, o vilão é levado para uma prisão de segurança máxima e ali é recrutado para a nova função. Da mesma forma, o grupo liderado por Amanda decide utilizar a insana Arlequina (Margot Robbie) nos planos, uma mulher violenta e sensual, que nutre uma paixão doentia pelo Coringa (Jared Leto).
O grupo, chamado de Esquadrão Suicida graças a uma "espirituosa" sacada do Pistoleiro, ainda conta com o Capitão Bumerangue (Jai Courtney), Crocodilo (Adewale Akinnuoye-Agbaje), Diablo (Jay Hernandez) e Katana (Karen Fukuhara). Para conter os ímpetos do grupo, Amanda conta com a vigilância de Rick Flag (Joel Kinnaman), um agente altamente experiente que carrega um dispositivo que pode explodir qualquer um dos vilões ao menor sinal de insubordinação.
A primeira ameaça do improvável grupo de salvação é deter Magia (Cara Delevingne), o espírito de uma bruxa que se apoderou do corpo de June Moone, a namorada de Flag. À princípio, Magia seria parte do Esquadrão Suicida, mas, utilizando um recurso narrativo frágil e pouco criativo, ela se rebela contra a influência de Amanda Waller e liberta o espírito do irmão para que, juntos, possam dominar o planeta.
Dirigido por David Ayer, "Esquadrão Suicida", como já dito no início, trazia uma premissa interessante e curiosa, bem executada nos primeiros minutos do filme, com a apresentação dos principais personagens. Dinâmica, realista e mais instigante, a primeira parte, infelizmente, dura pouco na tela e dá lugar a uma segunda trama, que envolve a magia do espírito que se rebela contra os vilões/heróis. A diferença entre os dois enredos é tão gritante e eles são tão distantes que a sensação é exatamente aquela descrita no começo do texto: ao que parece, são dois filmes independentes, que não têm nenhum ponto de convergência.
O que acontece, mais adiante, é que as duas tramas, que não se conversam, acabam sendo forçadas a se encontrar e isso resulta em uma história incoerente, perdida e enfraquecida por soluções fáceis que tentam justificar a "fusão de narrativas". O incômodo causado por essa condução é tão evidente que a conclusão do enredo "mágico" até proporciona um alívio e um desejo de que o longa volte a caminhar como nos minutos iniciais. No que diz respeito à narrativa, mais uma vez, a adaptação de uma história da DC para os cinemas soa equivocada.
Me parece, ainda, que há uma fragilidade também no tom que o filme quer transmitir ao público. Já é público que a Warner interferiu na proposta original do diretor, que queria algo mais realista e ambíguo para a trama. O estúdio, no entanto, influenciado pelos resultados massacrantes de "Batman versus Superman - A Origem da Justiça", quis que "Esquadrão Suicida" tivesse um viés mais bem humorado. O resultado disso é que, com algumas exceções, a graça pretendida foi incluída em momentos errados e a busca pelo desejado alívio cômico se tornou algo sem propósito dentro daquele contexto. No fim, o longa ainda flerta com um lado sentimental, que só empobrece o desfecho.
Os personagens, clássicos para os fãs de quadrinhos, eram uma grande aposta de "Esquadrão Suicida" e, é preciso dizer, que a impressão deixada é que, da forma como a história foi construída, eles funcionam melhor individualmente do que em conjunto. Amanda Waller, auxiliada pelo impecável desempenho de Viola Davis, é a personagem mais bem construída, com características mais ambíguas e complexas do que os demais. A Arlequina de Margot Robbie também se destaca, composta por fragilidades, loucura e amor na medida certa. 
O aguardado Coringa de Jared Leto faz quase que uma figuração de luxo, com cenas que deixam o personagem apenas na promessa de algo melhor. Se, por um lado, é bom ver um Coringa com uma faceta mais "gângster", por outro, a exagerada afetação do ator decepciona. Os demais só cumprem tabela e estão ali para ajudar a resolver os conflitos apresentados. O Pistoleiro interpretado por Will Smith é vítima do sentimentalismo equivocado do roteiro e, se não incomoda, também não é um grande acerto.
Mas, "Esquadrão Suicida", mesmo que possa parecer, não é só defeitos. A estética é, de longe, a melhor entre os filmes do universo DC. Desde os efeitos visuais, passando por figurino e cenário, e chegando à iluminação, tudo funciona bem e, com certeza, pode significar um crescimento importante para os longas do gênero. A trilha sonora é muito bem escolhida e aplicada no longa, pontuando bem momentos importantes.
Misturando qualidades e defeitos, apesar desses últimos serem mais marcantes, "Esquadrão Suicida" resulta em um filme que apenas cumpre tabela, deixando a sensação de que poderia ter aproveitado melhor personagens interessantes. Talvez, se fosse mais focado na formação do grupo e nas histórias individuais de cada componente, o filme pudesse ganhar em coerência. Querer misturar tramas opostas em uma só, ficou provado, não deu certo. 

ESQUADRÃO SUICIDA

COTAÇÃO: ★★ (regular)

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