"Até o Último Homem" acerta na ação, mas cria relações artificiais entre personagens

Ator mediano e, em algumas ocasiões, bem canastrão, Mel Gibson encontrou um outro caminho na direção, sendo, inclusive, premiado com o Oscar na categoria por "Coração Valente". É claro que, nessa função, ele não deixou de lado as controvérsias e seu nome virou sinônimo de polêmica, como aconteceu no lançamento de "Apocalypto". Agora, ele volta para contar uma história real em "Até o Último Homem", filme que recebeu seis indicações ao Oscar e que traz boas sequências de guerra, mas derrapa na construção dos relacionamentos entre os personagens.
"Até o Último Homem" se passa durante a Segunda Guerra Mundial, quando o jovem Desmond Doss (Andrew Garfield) decide se alistar no exército para servir seu país como médico dos soldados feridos em combate. Quando chega para o treinamento, ele se depara com um grande desafio: seus superiores, entre eles o sargento Howell (Vince Vaughn) e o capitão Glover (Sam Worthington), não se conformam que Doss não queria pegar em armas para se defender.
Religioso e, até certo ponto, afetado por um acontecimento da infância, Doss se mostra irredutível em ferir ou matar qualquer um de seus inimigos em combate. Isso faz com que ele sofra duras represálias e seja coagido a desistir da missão. O conflito acaba sendo resolvido por uma decisão superior e ele é autorizado a atuar como médico e a não tocar em nenhuma arma para se defender.
Incrédulo sobre o desempenho de Doss, o batalhão segue para a Batalha de Okinawa, para lutar contra os japoneses. Só que, em meio a um campo de guerra implacável e sangrento, o médico acaba surpreendendo os companheiros ao atuar sozinho, e sem armas, no salvamento de dezenas de colegas feridos no confronto.
Indicado ao Oscar de melhor diretor, Gibson consegue criar uma ótima atmosfera de guerra para a segunda metade do filme, quando começa, de fato, a ação. As sequências são intensas, barulhentas, violentas e muito bem executadas, criando uma tensão e, até certo ponto, deixando o espectador "exausto" com as cenas.
Até que o filme chegue a esses bons momentos, no entanto, o roteiro procura construir a personalidade do protagonista e seu relacionamento com familiares, a namorada e os colegas de farda. Nada sutil nessa tarefa, é aqui que o diretor não consegue se destacar. Com um roteiro tradicional e estruturado a partir de escolhas confortáveis, Gibson não conduz bem essas cenas, "pesando a mão" em sequências que exigem naturalidade e cedendo a clichês para estruturar a trajetória do protagonista no exército.
Exemplos dessa artificialidade podem ser percebidos em cenas da família de Desmond em volta da mesa, discutindo assunto corriqueiros e as escolhas ideológicas de seus membros. As sequências são tão forçadas que parecem, na verdade, paródias de época exibidas em programas de humor. Cenas de conflitos entre o protagonista e seus superiores são tão exageradas que também parecem ter saído desse tipo de programa.
A culpa disso tudo não é apenas de Gibson e o elenco também deixa sua contribuição. Assim como a direção e o roteiro, a maioria dos atores aparece exagerada em cena e com desempenhos rasos, que deixam poucas margens para nuances. O protagonista Andrew Garfield, indicado ao Oscar de melhor ator, começa o filme bastante caricato e vai melhorando com o decorrer das cenas, ficando aceitável nas sequências de guerra, que exigem mais dele.
Provando que é um bom diretor para sequências de ação, com "Até o Último Homem", o diretor prova, também, que precisa amadurecer seu olhar para cenas que exigem naturalidade e construções mais complexas do relacionamento entre os personagens. Com isso, ele poderá chegar a futuras premiações com trabalhos mais complexos, que irão além da ação.

ATÉ O ÚLTIMO HOMEM

COTAÇÃO: ★★ (regular)

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