Com uma carreira bem sucedida no teatro e na televisão, a atriz Fernanda Montenegro encontrou, no cinema, a possibilidade de ter o talento projetado para o mundo, a ponto de ser indicada ao maior prêmio da sétima arte, dividindo o ambiente com grandes intérpretes de Hollywood e sem dever nada a qualquer um deles.
Até receber uma indicação ao Oscar e ao Globo de Ouro por "Central do Brasil", lançado em 1998, Fernanda, que completa 90 anos nesta quarta-feira (16), percorreu um caminho de importantes trabalhos no cinema, fazendo diversos tipos de personagens. A primeira foi Zulmira, em 1965, no filme "A Falecida", dirigido por Leon Hirszman e com texto baseado na obra de Nelson Rodrigues, autor bastante presente na carreira da artista.
Posteriormente, a atriz teve a oportunidade de trabalhar com grandes nomes do cinema brasileiro, como Miguel Faria Jr, Zelito Viana, Cacá Diegues, Arnaldo Jabor e Suzana Amaral. Depois de "Central do Brasil", foi Nossa Senhora, uma mulher tentando acabar com a solidão, a mãe de Luiz Carlos Prestes e até uma mendiga que preza a liberdade das ruas.
Na trajetória artística, Fernanda Montenegro encontrou na tela grande do cinema uma janela do tamanho do próprio talento. Pensando bem, ela é maior, mas, com generosidade, se espreme na telona para que possamos acompanhar e nos emocionar com cada trabalho dela.
Para homenagear as nove décadas da maior atriz brasileira, resolvi listas alguns importantes trabalhos de Fernanda Montenegro no cinema para ver ou rever.
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1) Central do Brasil (1998)
O filme de Walter Salles correu o mundo e levou junto o nome de Fernanda Montenegro, que disputou o Oscar com algumas das atrizes mais consagradas de Hollywood, como Meryl Streep e Cate Blanchett. No fim, a indústria nem sempre justa premiou Gwyneth Paltrow, mas acabou provando que o Brasil não precisa de um prêmio se tem uma atriz como a intérprete de Dora, a mulher que escreve cartas em meio à correria das chegadas e partidas dos trens da Central do Brasil. A história une o destino da protagonista ao do menino Josué (Vinícius de Oliveira), fazendo a dupla embarcar em uma jornada de busca por afeto. O desempenho de Fernanda é emocionante, com sequências em que a atriz "engole" o espectador com o olhar. Particularmente, acho que esse é o trabalho da vida da artista.
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2) A Falecida (1965)
O cinema descobriu Fernanda Montenegro em "A Falecida" e, logo no primeiro filme, ficava claro que aquela relação seria para a vida toda. Baseado no texto de Nelson Rodrigues, o longa de Leon Hirszman mostrava a angústia de Zulmira, uma mulher simples que vai a uma cartomante e descobre uma possível ameaça. Sentindo que vai morrer, ela decide tomar todas as providências para garantir que tivesse um enterro de luxo, mas, nesse propósito, acaba colocando o marido a par de um segredo, que também envolve João Guimarães Pimentel (Paulo Gracindo). Explorando características como ingenuidade e uma inquietação reprimida, Fernanda carrega o filme com competência e segurança. Em uma das grandes cenas do longa, a atriz enche a tela com a alegria da personagem aproveitando uma simples chuva para esquecer as amarguras da vida.
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3) O Outro Lado da Rua (2004)
Pelas mãos do roteirista Marcos Bernstein, um dos responsáveis por "Central do Brasil", Fernanda Montenegro ganhou outra grande personagem da carreira cinematográfica. Regina, a protagonista de "O Outro Lado da Rua", é uma aposentada solitária que participa de um projeto da polícia para ajudar a coibir delitos. Observando a rotina do bairro de Copacabana, ela acaba presenciando o que acredita ser um assassinato e decide provar que estava certa se aproximando de Camargo (Raul Cortez), flagrado em atitudes suspeitas. O primeiro trabalho de Bernstein como diretor trouxe pontos em comum com o sucesso que rendeu a Fernanda uma indicação ao Oscar. Regina buscava amor e atenção onde pudesse para superar a solidão, o que ficava claro no olhar e na forte presença da atriz, que fez uma dupla inesquecível com Raul Cortez. Um trabalho delicado e muito envolvente.
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4) Eles Não Usam Black-Tie (1981)
Emblemático texto do teatro brasileiro, "Eles Não Usam Black-Tie" ganhou uma adaptação para o cinema dirigida por Leon Hirszman. Para encabeçar o elenco, foram escolhidos: o grande Gianfrancesco Guarnieri, autor do espetáculo; e a igualmente talentosa Fernanda Montenegro. O longa mostra as marcas deixadas pela ditadura militar no país e a eclosão dos movimentos sindicais, muito presentes no cenário político. Fernanda vivia Romana, a mãe de família que dava suporte às lutas do marido Otávio (Guarnieri) e tentava mediar a relação do companheiro com o filho, Tião (Carlos Alberto Riccelli). De novo, Fernanda retratava a força da mulher que se dedica a várias atividades e ainda tenta manter o núcleo familiar em equilíbrio. Mesmo em um papel secundário, a atriz rouba as cenas em que aparece.
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5) O Auto da Compadecida (1999)
A comédia de Guel Arraes, baseada na obra de Ariano Suassuna, é uma das mais populares do cinema brasileiro. Assim como no texto original para o teatro, a versão cinematográfica de "O Auto da Compadecida" virou quase um clássico moderno pela construção dos personagens e retratação de uma brasilidade de fácil identificação com o público. Na história de Chicó (Selton Mello) e João Grilo (Matheus Nachtergaele), Fernanda Montenegro se destaca como Nossa Senhora, chamada para interceder pelos personagens no julgamento final. Apesar do pouco tempo de tela, a atriz acabou virando um destaque do filme, que surge com ternura e precisão em um momento crucial da história. Só mesmo uma grande intérprete para viver uma figura religiosa tão importante para os brasileiros.
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